O Projeto de Lei Geral do Licenciamento Ambiental (PL 2.159/21) atravessou os corredores do Congresso, no percurso entre o Senado e a Câmara, cabendo a esta a apreciação final. Caso o projeto passe como veio, os parlamentares terão promovido um recuo de décadas no arcabouço legal que ancora a política para o meio ambiente no país. Ninguém disputa a necessidade de dotar o Brasil de uma legislação adequada na área. Trata-se de antiga demanda dos ambientalistas em face da barafunda de regras criadas ao sabor das circunstâncias, que tornam difícil, para dizer o mínimo, compatibilizar empreendimentos privados e públicos com a proteção do patrimônio ambiental e do bem-estar da população atingida.
PENDÊNCIA ANTIGA – O projeto destinado a sanar essa carência teve origem, em 2004, na proposta do então deputado Luciano Zica (PT-MG), membro atuante da Frente Ambientalista no Congresso. O texto retomava uma iniciativa de 1988 do então deputado Fabio Feldman (PSDB-SP) —que não prosperou.
Os 21 anos durante os quais a proposta de Zica ziguezagueou entre a Câmara e o Senado confirmam a crença popular de que tudo sempre pode piorar e muito. Na forma atual, o PL 2.159/21 compromete o esforço de adequação das atividades econômicas a princípios de sustentabilidade socioambiental. A análise detalhada de seus dispositivos, com impactos devastadores que tendem a acarretar, pode ser lida numa nota técnica do Observatório do Clima e nos artigos publicados nesta Folha, no último fim de semana, pelas colegas colunistas Txai Suruí e Marcia Castro.
JOGO POLÍTICO – Eis por que é imperativo olhar para o jogo político do qual resultou um retrocesso pronto a expor os brasileiros ao risco acrescido de desastres naturais evitáveis, além de reduzir os trunfos de que o país dispõe para se firmar mundo afora como potência ambiental. São óbvias as limitações de um presidente de centro-esquerda que se sustenta numa coalizão com partidos de direita e, como se não bastasse, tem de governar com um Legislativo majoritariamente conservador. Para dar certo, ao mandatário incumbe definir com clareza suas prioridades; negociar sem descanso; e ainda criar incentivos eficientes a fim de obter, no Congresso e na sociedade, apoios para aquelas pautas —a exemplo da ambiental— à míngua de simpatia espontânea das forças à direita do centro.
NADA DISSO OCORRE – Espantosamente, nada disso ocorre no debate do licenciamento ambiental. O governo está cindido entre os ministérios da Agricultura, das Cidades, dos Transportes e de Portos e Aeroportos —que sustentam o projeto— e o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima —que o considera instrumento da devastação. O Planalto nunca revelou sua preferência; não parece disposto a arbitrar o conflito; muito menos a explorar as notórias diferenças entre setores do agronegócio; ou a pensar em incentivos para facilitar a adesão de alguns deles a uma lei de licenciamento mais eficaz. No Senado, o PT e seus aliados de esquerda deixaram o barco correr e, ao fim e ao cabo, votaram contra, cientes da derrota. De volta à Câmara, o projeto ainda pode ser minimamente modificado; se vingar, resta ao Executivo a possibilidade de vetá-lo. Mas, se não abraçar de fato a causa ambiental, outras derrotas virão.
Drykarretada!